Nota Breve

Podia ter chamado este blog "Reflexões de uma luso-americana"; escolhi "Mensagem numa garrafa" por desconhecer o destino das minhas palavras e o impacto que estas terão. Será escrito nas versões de português de Portugal (pelos menos da maneira que me recordo) e de inglês americano.

This blog could have been named "Musings of a Portuguese-American"; I chose "Message in a Bottle" as I will never know who my words will reach and the impact they'll have on all those strangers. It is being written in American English, as well as in Portuguese from Portugal.

9 de setembro de 2014

Cinderella's wicked stepsisters



Detesto os rituais associados à morte mas detesto, ainda mais, hipocrisias. 
  
Não sei como é em Portugal, mas nos EUA quando uma pessoa morre é isto que, geralmente, acontece: durante 2 horas (à tarde ou à noite) as pessoas vão velar o morto à agência funerária; no dia seguinte de manhã é a Missa (ou qualquer outra cerimonia religiosa) de corpo presente, seguindo-se o funeral e, por fim, um almoço oferecido pela família do defunto ou numa casa particular ou num restaurante.

Pessoas bem vivas que nunca têm tempo umas para as outras, usam a funerária e o almoço para pôr as conversas em dia; ele são sorrisos, risos, beijos e abraços como se o ponto de encontro fosse um aeroporto ou uma estação de comboio qualquer após muitos anos sem se verem. Ouvem-se gargalhadas e vozes altas enquanto o pobre do morto está ali deitado, exposto e vulnerável, quem sabe com vontade de se levantar e gritar, “SHUT THE F&C$ UP!” E aquilo faz-me confusão.

Mas o que me faz ainda mais confusão é a hipocrisia. Pessoas que, enquanto o falecido foi vivo, não lhe ligavam nenhuma, nunca quiseram saber e agora, quando já é tarde demais, é que resolvem aparecer por obrigação e por dever (“to pay their last respects”, como é costume dizer).

E foi por isso que eu fiz o que fiz. Enquanto a vossa tia foi viva vocês nunca quiseram saber dela para nada. Nunca a visitaram no Hospital, na casa de convalescença, no apartamento, nem nunca lhe telefonaram. Nem quando sabiam que o fim estava perto e os dias contados se importaram. Assim que ela morre aparecem que nem abutres à procura de mobília para as vossas casas de férias e de dinheiro para pagar as propinas dos vossos filhos. Vocês são indecentes, egoistas e hipócritas. E é por isso que eu não vos quero na minha vida e Deus vos livre se aparecem no meu funeral só porque o dever e a obrigação o manda. E foi por isso que eu saí mais cedo da Igreja e fui para o carro à espera que aquilo acabasse – já não podia olhar para os vossos focinhos; e foi por isso que, quando entrei no restaurante e vi que o único lugar era na vossa mesa, dei meia volta e vim-me embora, deixando o vosso irmão e mãe a terem de procurar boleia. Depois arrependi-me.  Reconheço que esta não foi uma atitude bonita, mas toda a paciência tem limites e a minha já não aguenta mais. A vossa tia não merecia ser tratada daquela maneira enquanto viva. Vocês não mereciam a vossa tia. Vocês não prestam para nada. 

E é por tudo isto que, quando chegar a minha vez, recuso-me a ser protagonista em tamanha fantochada. Já está tudo decidido e legalmente documentado. Se ainda se aproveitar alguma coisa tirem todos os orgãos que forem precisos que a mim já não me fazem falta e o que sobrar será doado a uma Faculdade de Medicina local.  

Rituais estúpidos, oportunistas e gente falsa não é comigo.

Vocês as duas fazem-me lembrar estas duas:
 http://wordtothewomen.files.wordpress.com/2013/02/skin-tint-cinderella.jpg

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