Noam Chomsky é um homem
muito difamado neste país ... mas não por mim; eis algumas das razões porquê
(numa entrevista que concedeu à cadeia
de televisão Al Jazeera, o académico aborda os seguintes temas e defende as
seguintes teses):
I – Com o privilégio vem responsabilidade
Chomsky
defende que estar envolvido na política é um direito cívico e dever de todos
nós; porém, esta responsabilidade deve ser medida pela oportunidade, ou seja,
quem trabalha 60 horas por semana para poder pôr comida na mesa tem
forçosamente menos responsabilidade do que quem tem um certo grau de
privilégio: “the more privilege you have the more opportunity you have; the more
opportunity you have, the more responsibility you have..it’s elementary.”
A razão
porque isto não se vê nos Estados Unidos é simples (um país onde a classe média
de outrora é cada vez menor e onde há
cada vez mais pobres... enquanto que a riqueza está cada vez mais concentrada
num pequeno grupo de indivíduos): “If you dedicate your life to enriching
yourself and those are your values and you don't care what happens to anyone
else (...) it's self-selective; it's also institutional. In its most extreme and pathological form it's the Ayn
Rand ideology 'I just don't care about anyone else, I'm only interested in
benefiting myself and that is good and noble'". Esta maneira de encarar a
vida, a meu
ver, explica porque tantas pessoas votam contra os seus próprios interesses:
enquanto que o individualismo é visto por muitos como sendo “bom e nobre”,
o colectivismo é sinónimo de socialismo,
i.e., algo de perverso e a evitar como o diabo.
II – Os riscos da obsessão com os lucros a curto prazo
Esta preocupação contínua foi muito além
da derrocada do sistema financeiro: “that’s bad enough but there’s another
externality that’s much more severe...the destruction of the species and that’s
not a joke (...) it’s imminent that global warming will cause major
catastrophe, you can argue about the details but not much doubt that it’s
coming and if you don’t pay attention to it because it’s an externality, ‘I’m
interested in gain not what happens to my grandchildren,’ then you’re going to accelerate the disaster
(…) that’s the most severe of all of them (….) inherent to the market
system(…)” Para evitar esta e
outras tragédias, o professor defende então implementar (ou reforçar) um
sistema de controlos e equilíbrios e explica que: “in the 1950s and 1960s, which was
the biggest growth period in American history, financial institutions were
regulated (…) and there were no financial crisis.” Infelizmente, há 3 décadas a esta parte que
os eleitores são sistematica e lentamente
indoutrinados a crer que “government is bad...free market is
good...capitalism is the only viable system and the good-old American way.”
III – A globalização
Não é fruto de nenhuma desestabilização
do sistema natural, mas o resultado de uma série de decisões tomadas “(...)
to reconstruct the economy so as to undermine domestic production and send it
out to Bangladesh and to shift investment to finance rather than production.” Chama-se a isto políticas neoliberais – com consequências
desastrosas para tantos (não vou agora entrar em discussões sobre os
benefícios, nomeadamente o desenvolvimento económico dos chamados
mercados/países emergentes). Nos EUA estas consequências não são tão dramáticas
como os programas de austeridade em certos países europeus mas, mesmo assim,
têm resultado em: “dramatic concentration of wealth, the stagnation and the decline for
much of the population, the increasing poverty (...) and for repressed parts of the population it really is a catastrophe.”
IV – Motivos Ocultos
As elites
usam o poder para controlar milhões de pessoas:
Chomsky acha impressionante existirem hoje indústrias dedicadas
exclusivamente a controlar as atitudes e opiniões do mercado promovendo, assim,
uma certa imagem para os seus clientes perante os olhos de consumidores e
eleitores; não menos impressionante foi o facto de a indústria de Relações
Públicas nascer na Inglaterra e nos Estados Unidos da America, em princípio os
dois países mais livres do Mundo: “(...) the business world understood that it was getting harder to control
people by pressure (…) the people were getting too many rights ‘so we got to
move on and control attitudes and opinions’ (…) markets are based on informed
consumers making rational choices (…) turn on the television and then look at
an ad, are they trying to make informed consumers who will make rational
choices? (…) the whole
thing is trying to create uninformed consumers making irrational choices (…)
this huge industry is largely devoted to undermining markets (…) suppose you
turn to elections (…) the PR industry
basically runs the elections, are they trying to create informed voters who
make a rational choice? No, quite the opposite, they want to undermine democracy by creating uninformed
voters who will make irrational choices (…) this huge industry, paid
hundreds of millions of dollars a year, dedicated to undermining markets and
democracy and nobody says anything (…) it’s transparent, it’s not profound, but
try to find somebody who says it (…) we have to keep the masses uninformed,
marginalized, so that we, ‘the responsible men’, can run things (…) for their
own benefit we’ve got to control them, just as we don’t let a three year old
run into the street, that’s the way we’ve got to treat the population” – AMEN professor Chomsky!
Ao
sequestrar certo vocabulário, estes “todos-poderosos” sucederam em alterar o
significado de certas palavras de modo a melhor satisfazer as suas necessidades
e interesses e assim avançar as suas agendas. E como linguista que é, Chomsky
percebe de semântica e consegue ver
através do nevoeiro.
Noam
Chomsky fala ainda na arrogância e descaramento do “banqueiro de fato e
gravata” (referindo-se ao alto custo para o contribuinte dos processos de
litígio iniciados pela seguradora multinacional American International Group/aka AIG); explica como a política externa americana vai contra
princípios de direito anglo-americano que remontam ao séc XV; e, com apenas
meia dúzia de exemplos, prova como a liberdade de expressão nos Estados Unidos
não passa de uma mera ilusão.
Gostei muito desta entrevista. Partilho muitos destes
pontos de vista, mas nunca poderia exprimi-los tão eloquentemente como este senhor.
Talvez por isso me tenha alargado mais do que tencionava: são 25 mns que valem a pena
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