Nota Breve

Podia ter chamado este blog "Reflexões de uma luso-americana"; escolhi "Mensagem numa garrafa" por desconhecer o destino das minhas palavras e o impacto que estas terão. Será escrito nas versões de português de Portugal (pelos menos da maneira que me recordo) e de inglês americano.

This blog could have been named "Musings of a Portuguese-American"; I chose "Message in a Bottle" as I will never know who my words will reach and the impact they'll have on all those strangers. It is being written in American English, as well as in Portuguese from Portugal.

13 de dezembro de 2016

Cuidados Paliativos



Desde há uns anos a esta parte que faço voluntariado na secção de cuidados paliativos num Hospital. Esta tem sido uma experiência deveras enriquecedora. Não só por me ter tirado o medo da morte como, também, por me ter ensinado muitas lições valiosas, entre as quais:

1-) Muitas destas pessoas são carentes do toque humano. Tive uma senhora que, comovida, se queixou que são poucos aqueles que ainda lhe dão um beijo, ou um abraço; “nunca mais tive quem me fizesse uma festinha ou me desse a mão” disse-me, lutando contra as lágrimas e de lábio a tremelicar.

Frequentemente, o que acontece, é que familiares e amigos de muitos doentes que se encontram à beira da morte afastam-se (sobretudo) por medo. Medo de não saberem lidar com a situação e de dizerem a coisa errada; medo de se aproximarem; medo da própria morte. Isto é um erro. A morte, por si só, não é contagiosa e esta não é a altura de pensarmos em nós; temos de deixar de ser egoistas e fazer tudo (mas mesmo tudo) ao nosso alcance para fazer o que resta dos dias destes pacientes o mais agradável possível. 

2-) As pessoas que estão a morrer muitas vezes sentem que já perderam tanto controle sobre as suas vidas que, quando bem-intencionados lhes aparecem lá em casa de surpresa para fazer limpezas, lavar a roupa, dizer-lhes o que devem (ou não) vestir, comer, etc, etc. etc., o efeito é o oposto do desejado. Nenhum adulto gosta de voltar a ser tratado como uma criancinha.

3-) As pessoas que estão à beira da morte ainda estão vivas. Necessitam de convívio, de rir, de recordar. Querem aproveitar ao máximo o pouco tempo que lhes resta. Querem estar com os seus entes-queridos enquanto podem. Alguém que está morrendo pode aparentar um ar diferente, pode falar de maneira diferente e, inclusivé, pode até ter um cheiro diferente. Muitos não conseguem fazer muitas das coisas que antes faziam.

Muitas vezes, todas estas mudanças (aliadas ao medo da própria morte que muitos sentem, ou por receio de dizer ou fazer asneira) faz com que os amigos e familiares se afastem e que mandem recados a dizer que estão a pensar no doente e a rezar por eles.

Isto é um erro. Isto só serve para que o doente terminal sofra ainda mais. Desnecessariamente.

4-) Muitos destes doentes rezam para que a morte os leve depressa. Reconhecem que são hoje uma sombra do que outrora eram e estão fartos de sofrer ou de se sentirem um fardo para os outros. Porém, quando desabafam com amigos e familiares, estes recusam falar no assunto – o que faz o doente sentir que não pode ser completamente honesto, ou que os seus desejos não são respeitados.

Mas também existem muitos pacientes cujas famílias estão convencidas que os seus entes queridos não estão com medo devido às suas crenças religiosas; depois, assim que a família sai do quarto, desatam num pranto de lágrimas, apavorados com o que lhes está a acontecer e gratos pela oportunidade de, finalmente, terem alguém com quem desabafar e falar deste medo que lhes atormenta a alma.

                                                                CONCLUINDO
A morte não é uma coisa com que a maioria de nós lide diariamente, portanto é perfeitamente natural que a doença terminal de um ente-querido nos assuste e que este medo nos leve a dizer (e/ou a fazer) a coisa errada. Mas, os doentes terminais nos cuidados paliativos estão normalmente rodeados de enfermeiros, auxiliares de enfermagem, assistentes sociais, etc., que geralmente sabem o que estão a fazer. Peçam-lhes informações e conselhos. Não há que ter vergonha. A única pergunta estúpida é a que ficou por fazer.  A ignorância e o medo não são razões para se afastarem. Respeitem o doente e perguntem em que podem ajudar e ajudem, mas não façam nada sem primeiro terem a certeza de que é essa a vontade explícita do doente. De boas intenções está o inferno cheio.

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